terça-feira, 25 de setembro de 2012

Trecho do meu novo livro



           O fogo que iria resplandecer seria capaz de devolver-lhe a vida que antes queimava, ardia e inundava todo o seu ser? Belizário Veiga estava parado em frente à casa de Sebastiana, do outro lado da rua, como se alienado estivesse a tudo à volta. Entre seus dedos úmidos um cigarro desaparecia. Em sua cabeça, a inundação quente do encontro com Ester no dia anterior, suas repetidas frases de ódio e morte. Dias antes já havia se entregado a um funeral prematuro de sua alma, quando pensou que nada mais nesse mundo pudesse devolver-lhe as chances de sobrevida que tanto inflamaram o seu ser em tempos atrás. Agora, prestes a cometer um ato que poderia, pois bem, poderia acender novamente a chama do candeeiro que apagou nem se sabe ao certo porque. E de novo, ao dar uma última tragada, a pergunta se repetia em sua mente: o fogo que iria resplandecer seria capaz de devolver-lhe a vida que antes queimava, ardia e inundava todo o seu ser?
            Olhou para ambos os lados, atravessou sem pressa, amparou suas mãos na madeira áspera, velha e corroída do portão a pender para um dos lados como se estivesse quase a cair. Ele rangeu quando empurrado de leve e Belizário retraiu-se. Um passo atrás foi dado. Olhou fundo para a casa silenciosa. Só o que viu foi uma sombra idêntica a de um personagem visto antes somente em suas histórias infantis. A sombra de um velho modorrento, com uma lamparina de azeite na mão esquerda, com voz de assombro, dentes tortos e uma solidão que o fazia ceifar da face da terra, todos os dias, incontáveis almas. Esse mesmo ser de imagem cruel, mas necessária ao nosso mundo limitado de caber tanta gente, foi visto por Belizário a rondar os limites da casa onde iria adentrar em poucos instantes. A alucinação, ou o pensamento de estar louco, conferiu a ele a certeza de que, mesmo que não desse inicio ao incêndio, de nada adiantaria, pois o monstro ceifador de almas já estava de prontidão para recolher ao reino dos espíritos mais um número incontável de seres viventes. Ninguém pode fugir quando chega o seu dia de morrer.

2 comentários:

  1. Parabéns, Mike.Gostei do que li 98/%.srsrO que virá depois?rsrs
    Abraços,
    Elô

    ResponderExcluir
  2. Adorei a capa, Sullivinha. Quanto à estória... bem, a estória não faz muito o meu estilo literário. Mas, tenho certeza, deve ser uma das mais excitantes para você. Parabéns e muito sucesso.
    Beijos,
    Ana Lima

    ResponderExcluir