“Decálogo”,
do grande diretor polonês Krzysztof
Kieslowski, é um projeto difícil de classificar e árduo de
descrever. Foi filmado em 1988, em formato de minissérie para a TV polonesa.
A ideia inicial do cineasta era fazer
um pequeno filme sobre cada um dos Dez Mandamentos. O projeto partiria de uma
reflexão mais ampla a respeito da decadência dos valores católicos em uma
Polônia transformada durante o século XX em terra devastada, pelos nazistas, e
depois em território de ateísmo obrigatório, pelos comunistas. Enquanto
escrevia as histórias, contudo, Kieslowski mudou de ideia. Retirou todas as
referências à política, ao tempo e ao país, e deu dimensões mais universais à
narrativa.
O formato é virtualmente perfeito
para introduzir o espectador num dos projetos mais densos e belos já formatados
para a TV. “Decálogo” é Kieslowski – o último dos grandes cineastas europeus a
beber na fonte do existencialismo, a exemplo de Bergman e Antonioni – na
plenitude de seus poderes de dramaturgo. Nas dez histórias, todas ambientadas
em um conjunto residencial de Varsóvia, pessoas comuns enfrentam problemas
cotidianos que se manifestam em diversas camadas de significados. Nas histórias,
Kieslowski propõe uma discussão livre sobre temas universais da condição
humana: amor, culpa, solidão, amizade, tristeza, ética, medo.
O fio narrativo comum é o espaço em
que as tramas se desenrolam. O conjunto de apartamentos, com sua arquitetura
monótona típica dos países do Leste europeu, sugere que, dentro de cada uma
daquelas janelas, um drama universal e, ao mesmo tempo, particular se
desenrola. Kieslowski sugere ter escolhido, quase aleatoriamente, dez dessas
histórias para narrar.
“Decálogo” é
cinema em um nível de excelência que não existe mais, obrigatório na coleção de
qualquer cinéfilo que se interessa pelos mistérios da natureza humana.
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